O Livro do Apocalipse – Conteúdo
Para entender, seria bom que você estivesse com sua bíblia aberta no livro do Apocalipse. Vamos ver juntos?
O Apocalipse é emoldurado pelo tema da Igreja. No início, depois do pequeno prefácio (1, 1-3) segue a visão da Igreja, com uma introdução (1, 4-8) e uma visão inicial (1, 9-20), que se desdobra nas cartas às sete igrejas (caps. 2-3). Contrabalança esta parte à visão da Nova Jerusalém e do Esposo que vem ao encontro da esposa, a Igreja, nos caps. 20-21.
A partir do cap. 4 começa a visão profética do momento histórico dos leitores. O profeta mostra alternativamente o que se vê no céu, junto a Deus e do Cordeiro imolado e vencedor (Jesus Cristo glorioso), e o que se vê na terra ou no cosmo. Os caps. 4-5 mostram a liturgia celeste e o livro da história, que só o Cordeiro pode abrir. A visão final do Cordeiro vitorioso nos caps. 19-20 contrabalança esta grandiosa visão inaugural.
A parte central do Apocalipse é construída com o recurso literário do suspense, que evoca a experiência da Igreja no fim do 1o. século (a demorada espera da parusia). Inicia-se a abertura dos sete selos (6-7), mas o sétimo selo não é aberto, e há um silêncio no céu (8, 1). Segue a visão das sete trombetas (8-9), mas antes da sétima trombeta, não se descreve nenhum acontecimento cósmico,e sim, a abertura do céu (11, 15-19).
No céu aparece então a visão central do livro: a luta entre a Mulher (= o povo de Deus, cf. a Igreja no início e no fim do livro) e o Dragão (= as forcas do mal), secundado pela Fera e o Falso Profeta (ou a segunda fera). Esta visão central é o sétimo selo e a sétima trombeta, sendo concluído pelas sete taças (15-16). Culmina na destruição do poder inimigo, chamado a prostituta Babilônia, por causa da prostituição religiosa (idolatria), mas também política e econômica (caps. 17-18). As sete taças dão a entender que do mesmo modo o sétimo e a sétima trombeta se completam na plenitude da história (3 x 7).
Os caps. 19-20, já em tom de vitória, mostram que a vitória sobre o Dragão embora decidida não exclui suas convulsões nos dias presentes. Ainda não é fim. O profeta vê a ressurreição dos mártires e o reino dos justos (os “mil anos” – que para Deus são apenas um dia…); Satanás, porém, tem ainda um momento, mas o profeta vê também sua destruição total (a segunda morte), e com ele desaparecem os lugares simbólicos do mal (o mar).
Então haja lugar para a visão do novo céu, da nova terra, da nova Jerusalém (21-22), há visões que repetem muitos termos da visão inicial das sete igrejas: Ap fica assim emoldurado entre as sete igrejas da história, início, e a igreja celestial, “esposa do Cordeiro”, que aparece no fim do livro e se expressa na liturgia que o encerra.
Temas Específicos
- O testemunho. Tanto Jesus que aparece ao profeta apocalíptico, como ele mesmo e também os fiéis, são chamados de testemunhas, mártires como se diz em grego, o que evoca a realidade do testemunho da fé até a morte, nas igrejas do Ap. O exemplo vem do próprio Jesus.
- O “espírito da profecia” (19, 10). O Espírito leva os que têm o dom da profecia, em primeiro lugar o autor de Ap, a dar testemunho de Jesus. A igreja do Ap é uma igreja na qual ainda vigora a inspiração profética (cf. Evangelho e Carta de João).
- A Mulher-Povo-Igreja. Retomando o costume do AT, Ap apresenta a comunidade fiel sob as figuras, primeiro da Mulher que traz ao mundo o Messias (12-14) e, no fim, da Noiva preparada para o Esposo – que no At é Deus e, no NT, o próprio Jesus Cordeiro na glória do Pai (21). E com a mulher infiel, a “prostituta” Babilônia.
- De modo paradoxal, Jesus é ao mesmo tempo o Cordeiro imolado e o Senhor dos Senhores. Pois dando sua vida, na fragilidade da morte, ele vence as forcas históricas e supra-históricas do Mal que aparentemente dominam o mundo, e recebe o titulo que era dado aos dominadores dos impérios orientais. Senhor dos Senhores.
- A esperança e a perseverança. O olhar apocalíptico serve para abrir uma perspectiva de esperança, que nos dá forca para perseverar no seguimento do Cordeiro. As cartas às igrejas terminam sempre: “o vencedor…”.
- A liturgia. Ap está cheio de liturgia: as visões da liturgia celeste em torno do trono de Deus e do Cordeiro (4-5 etc.), mas também a liturgia da igreja na terra que acolhe o Senhor que vem (22, 17). Na liturgia celebramos não só nossa vida atual, mas sobretudo sua plenitude já realizada pelo Cordeiro imolado, na glória do Pai.
Na semana que vem, voltaremos ao Apocalipse de São João para ver um pouco melhor alguns pontos abordados, como a besta, o número 666, o anticristo, a besta de sete cabeças…. são muitas curiosidades, uma mais interessante do que a outra!
Até semana que vem, e continuem lendo nossa formação bíblica.!
Padre Jair
O Apocalipse (Ap) apresenta-se como a visão do “profeta” João, que “por causa da palavra de Deus e do testemunho da fé se encontra na Ilha de Patmos” (exilado 1, 9). A antiga tradição identifica – mas não unanimemente – este profeta com o apostolo João, filho de Zebedeu, presumível autor do quarto Evangelho.
Ap revela uma situação de perseguição e de desistências, provavelmente no fim do século I, na Ásia Menor (hoje Turquia). As pressões externas são perseguições, o regime político e econômico do Império Romano, o culto ao Imperador (Domiciano, 81-96 dC).
Ap revela uma situação de perseguição e de desistências, provavelmente no fim do século I, na Ásia Menor (hoje Turquia). As pressões externas são perseguições, o regime político e econômico do Império Romano, o culto ao Imperador (Domiciano, 81-96 dC).
Este livro só se entende quando se leva em consideração seu gênero literário apocalíptico, que tem modelos no AT (sobretudo Ezequiel e Daniel). Assim, o “profeta” apocalíptico, guiado pelo Espírito, vê em imagens, parecidas com as visões do sonho, aquilo que o olho humano não vê. Na verdade, este estilo literário é um recurso usado em tempo de perseguição. João, havia fundado várias comunidades por onde passou, e queria alimentá-las no seguimento de Jesus Cristo, para não desanimares na perseguição que os cristãos sofriam, da qual ele mesmo era vitima, preso na Ilha de Patmos. Assim, ele escreve em códigos que possibilitavam às comunidades entenderem seus escritos e pensamentos.
Preso na Ilha de Patmos, tudo o que ele escrevesse passaria por uma censura. Suas cartas eram lidas pelos soldados, exatamente como acontece em nossos dias. Por isso ele usa este recurso, para que somente as Igrejas entendessem. Neste recurso, por isso, sempre que o qu ele fosse dizer fosse novidade e importante para as comunidades, ele começava dizendo que foi um sonho ou uma visão. Como hoje, os “visionários e os sonhadores”, negativamente falando, são vistos como loucos. Assim, a censura relaxava e liberava a carta. O que fez do apocalipse um livro altamente simbólico.
Um exemplo claro disso está na numerologia que ele usa sobre a besta. O que ele fala sobre a mulher que está pronta para parir, no deserto, e do dragão que deseja devorar-lhe o filho.
Essas imagens evocam as mensagens dos grandes símbolos bíblicos e/ou antropológicos. Não devem ser vistas como descrições realistas de algum fato presente ou futuro, embora algumas alusões a fotos reais colaborem para tornar as imagens mais contundentes. O “apocalíptico” vê “o céu aberto”, ele enxerga as coisas na ótica de Deus. Com um olho ele observa o que acontece na terra (perseguição); mas com outro ele vê no céu a glória do Cordeiro Imolado e dos mártires vencedores. Com estes dois olhos ele tem a visão de profundidade!
Assim, o Apocalipse é um apelo à firmeza e é uma mensagem de esperança. Nos bastidores, a história é diferente do que parece. Vale a pena resistir ao Dragão e às suas feras, mesmo que custe a vida (a primeira morte): pela fidelidade, os fiéis participarão da ressurreição e não conhecerão a “segunda morte”, a morte de verdade.
O Apocalipse não é uma especulação futurológica, nem um livro para confundir nossa cabeça, é expressão de resistência e de esperança para a atualidade dos fiéis. As alusões à historia são difíceis de decifrar e, às vezes, contraditórias. O importante não é saber se a Fera é Nero ou Domiciano, mas perceber que ela representa o Dragão, o poder do mal que é maior do que a história momentânea e que quer competir com o poder transcendente de Deus mesmo. Por isso, as imagens de Ap são indefinidas, “surrealistas”, escapam de interpretações fechadas, e são, por isso, sempre atuais. Mas o Apocalipse nos ensina a ver a história à luz daquilo que se cumpriu definitivamente na morte e ressurreição do Grande Mártir e Testemunha, Jesus, o Cordeiro “de pé, como que imolado” (5, 6). É ele quem abre o livro da historia, ele tem a última palavra sobre a história humana (5, 9).
O Apocalipse anuncia o encerramento das Escrituras. Daí a multidão de citações, referidas nesta edição do rodapé. Quase todas as imagens são tomadas do AT (sobretudo Gn, Ex e os profetas: Is, Ez, Dn, Zc…), pois em Cristo cumpriram-se as Escrituras, e elas continuam cumprindo-se em favor daqueles que o seguem com perseverança.
Pra entender melhor o estilo literário do Apocalipse como tempo de perseguição, proponho que vejas o filme:http://www.youtube.com/watch?v=kI6wQ1I5tGs
Ainda hoje, a continuação do Apocalipse de São João! Espero você mais tarde!!
Epístolas Católicas
Diferente do que podemos atribuir a São Paulo, este grupo de escritos se caracteriza mais por ser um grupo de Epístolas do que cartas. Pelo seu significado, amplitude geral (e não grupos ou pessoas específicas) e características, é mais conveniente chamá-las de Epístolas a Cartas, embora este não seja, como em São Paulo, um consenso.
Compreende os livros de Thiago, Pedro, Judas e João. Desde o seu início foram denominados Católicos (ou seja, universais) por não serem endereçados a nenhuma comunidade, a nenhuma pessoa, mas a todo e qualquer católico, em qualquer lugar, que as pudesse ler. Ainda assim, era preciso ter credibilidade para que a Epístola fosse “aprovada”. Por isso, o uso de alguns pseudônimos (como em São Tiago 1,1)
São Tiago
Do autor:
A tradição identificou Thiago como “irmão do senhor”, chefe da Igreja de Jerusalém. Não se trata então, do Apóstolo. Segundo a opinião crítica, ele é um cristão-judeu de 2º geração, com boa formação e conhecimentos do NT. Neste caso, Thiago é um pseudônimo.
Contexto:
Passa por grandes linhas, dentre elas:
- O ensinamento moral (de modo particular, o sapiencial): seus ensinamentos buscam solidificar uma forma de praticar a vontade divina (1,20; 2,5; 4,5s)
- O ensinamento social: sua principal exortação é sobre a dignidade dos pobres e advertência aos ricos sobre a finitude da vida, caducidade de seus bens e necessidade de tratar bem os pobres (2, 14-26; 2, 5-9; 5, 4-6)
- A unção dos enfermos: a oração e a unção são os caminhos da recomposição das forças e da saúde do doente e ao mesmo tempo do perdão e da misericórdia de suas faltas (5, 14-15)
São Pedro (1 e 2)
Do autor:
Pela Patrologia, as duas Epístlas de São Pedro foram escritas pelo mesmo Pedro, o apóstolo. Porém, com o avanço dos estudos vemos uma certa variaçãona veracidade dessas Epístolas: a linguagem e estilo gregos são impróprias para um pescador galileu.
Contexto:
Da 1º Epístola: São Pedro fala muito sobre a liturgia batismal. A 1º parte revela o que pode ser um esboço do tipo de catequese batismal já usado em Romanos. A 2º parte pode ser tomada como um conjunto de exortações aos catecúmenos como um estímulo a permanecerem firmes na fé. Pedro também faz exortações quanto ao tipo de comunidade hierarquizada.
Da 2º Epístola: é um apelo à fidelidade da fé. A prática da virtude deve ser progressiva. Fala sobre o castigo e a Escatologia, já que os falsos profetas receberão a recompensa de suas obras através da volta de Jesus e de Seu julgamento.
São Judas
Seu livro consta de um único capítulo. Após a saudação, descreve os falsos mestres, oferece recomendações aos fieis e conclui com a doxologia.
Autor:
Quanto à autoria, a 1º hipótese é que seja Judas de fato, pois ele se apresenta como irmão de Tiago. A 2º é que seja um pseudônimo que se utiliza do fato de ser irmão de Tiago para ganhar credibilidade.
Contexto:
Seu livro apresenta uma preocupação com a falsa doutrina. Está em boa concordância com o NT, com os escritos paulinos e principalmente com a 2º Epístola de São Pedro.
São João
São escritos que trazem uma mesma característica de conteúdo e estilo, o que nos assegura que o autor das três Epístolas é o mesmo e que a crise da comunidade o preocupa muito.
1º Epístola: não traz o nome do autor nem seus destinatários. Dentre suas preocupações, estão:
- A incompatibilidade entre a vida cristã e o pecado. Se Deus é luz, quem está com ele possui as mesmas características e não é possível ao cristão ter um outro comportamento.
- Andar do jeito de Jesus Cristo: a coerência entre o falar e o agir identificam ou desmentem a verdadeira situação da pessoa.
- Amar para vencer as adversidades: o amor não tem idade, é tarefa de crianças, jovens, adultos e anciãos
- Evitar anticristos: aqueles que pregam a sensualidade, o liberalismo e a autonomia asboluta da consciência, negando os mandamentos e a Cristo.
2º Epístola: se aproxima mais de um bilhete, apresentando 13 versículos, com destinatário e remetente. Quem escreve é o ancião e o destinatário é a senhora eleita e seus filhos. Resta saber quem é esta senhora, mas alguns acreditam que ela fosse alguma líder de comunidade.
3º Epístola: endereçada ao presbítero Gaio. Aqui não se revelam perigos à fé, heresias ou coisas semelhantes. A preocupação é com a falta de hospitalidade expressada pelo chefe desta comunidade.
Karine Belo
Teóloga (PUC-Rio) e Catequista – PSF
Epístola de São Paulo aos Hebreus
1. Autoria
Na tradição latina, a epístola recebeu o título de Epístola de São Paulo aos Hebreus. Essa indicação não existe no texto grego. A epístola não menciona nenhum remetente nem destinatário. Logo, pelo exame destes dados não podemos atribuir o escrito a Paulo.
Existem alguns dados distoantes com os escritos de Paulo em geral:
1) 140 palavras novas;
2) o melhor grego de todo o Novo Testamento;
3) as citações da Bíblia grega, que Paulo faz muitas vezes de memória, no escrito aos Hebreus são copiadas cuidadosamente do texto grego.
Existem também idéias comuns entre o escrito aos Hebreus e o epistolário Paulino:
1) Teologia elevada da cruz;
2) Hb 5, 7 e Fl 2, 8: falam da paixão como obediência;
3) Elevação de Cristo à direita de Deus depois da paixão (Rm 8, 34; Fl 2, 9);
4) Cristo como mediador da criação (Cl 1, 15-17 e Hb 1, 3s).
O tema central da carta (Hb 7, 1 – 10, 18) apresenta Cristo como sendo o Sumo Sacerdote. Paulo nunca se utilizou desta comparação. A carta faz uma comparação entre o Antigo Testamento e o Novo: Melquisedec e Cristo; a Antiga e a Nova Lei; o antigo e o novo culto etc.
A opinião da Tradição era dividida: os Padres gregos atribuíam o escrito a Paulo, os Padres latinos não. Nos manuscritos gregos, a epístola se acha no meio das cartas paulinas e não no fim. Clemente vai dizer que a carta teria sido escrita em hebraico por São Paulo e depois traduzida para o grego por São Lucas. Para Orígenes, por sua vez, os pensamentos eram de São Paulo, mas outro teria escrito a carta parafraseando o apóstolo. No Ocidente não se considerava o escrito como Paulino. Foi por influência do Oriente que, a partir do século IV, com Hilário de Poitiers que tinha ido à Ásia Menor, que a autoria paulina se impôs.
Na tradição latina, a epístola recebeu o título de Epístola de São Paulo aos Hebreus. Essa indicação não existe no texto grego. A epístola não menciona nenhum remetente nem destinatário. Logo, pelo exame destes dados não podemos atribuir o escrito a Paulo.
Existem alguns dados distoantes com os escritos de Paulo em geral:
1) 140 palavras novas;
2) o melhor grego de todo o Novo Testamento;
3) as citações da Bíblia grega, que Paulo faz muitas vezes de memória, no escrito aos Hebreus são copiadas cuidadosamente do texto grego.
Existem também idéias comuns entre o escrito aos Hebreus e o epistolário Paulino:
1) Teologia elevada da cruz;
2) Hb 5, 7 e Fl 2, 8: falam da paixão como obediência;
3) Elevação de Cristo à direita de Deus depois da paixão (Rm 8, 34; Fl 2, 9);
4) Cristo como mediador da criação (Cl 1, 15-17 e Hb 1, 3s).
O tema central da carta (Hb 7, 1 – 10, 18) apresenta Cristo como sendo o Sumo Sacerdote. Paulo nunca se utilizou desta comparação. A carta faz uma comparação entre o Antigo Testamento e o Novo: Melquisedec e Cristo; a Antiga e a Nova Lei; o antigo e o novo culto etc.
A opinião da Tradição era dividida: os Padres gregos atribuíam o escrito a Paulo, os Padres latinos não. Nos manuscritos gregos, a epístola se acha no meio das cartas paulinas e não no fim. Clemente vai dizer que a carta teria sido escrita em hebraico por São Paulo e depois traduzida para o grego por São Lucas. Para Orígenes, por sua vez, os pensamentos eram de São Paulo, mas outro teria escrito a carta parafraseando o apóstolo. No Ocidente não se considerava o escrito como Paulino. Foi por influência do Oriente que, a partir do século IV, com Hilário de Poitiers que tinha ido à Ásia Menor, que a autoria paulina se impôs.
A exegese atual, tanto católica como protestante, afirma que o escrito não é de Paulo, e também não se trata de uma carta, mas de uma espécie de tratado, que teria sido escrito por algum judeu culto.
2. Destinatários, lugar e datação
O escrito não traz originalmente o título ‘aos hebreus’. Este deve ter sido atribuído em virtude de se tratar aqui temas ligados ao mundo judaico. A exegese moderna afirma que o escrito era dirigido tanto a judeu-cristãos como a convertidos do paganismo.
Quanto à datação, ela é citada em escritos de Clemente Romano (95/96). Logo, ela foi escrita antes desse período. Contudo, não se data a epístola cedo demais, porque ela apresenta uma comunidade com uma história já constituída.
Baseados em Hb 13, 24 alguns acreditam que teria sido escrita em Roma, por um judeu culto.
O escrito não traz originalmente o título ‘aos hebreus’. Este deve ter sido atribuído em virtude de se tratar aqui temas ligados ao mundo judaico. A exegese moderna afirma que o escrito era dirigido tanto a judeu-cristãos como a convertidos do paganismo.
Quanto à datação, ela é citada em escritos de Clemente Romano (95/96). Logo, ela foi escrita antes desse período. Contudo, não se data a epístola cedo demais, porque ela apresenta uma comunidade com uma história já constituída.
Baseados em Hb 13, 24 alguns acreditam que teria sido escrita em Roma, por um judeu culto.
3. Estrutura e Teologia
Prólogo: 1, 1-4
1ºanúncio 1, 4: Cristo herdou um nome superior aos anjos
1ª Parte 1, 5 – 2, 18
1, 5-14: Cristo glorificado junto com Deus
2, 1-4: breve exortação
2, 5-18: Cristo e sua relação com os homens
2º Anúncio: 2, 17-18: Cristo, Sumo Sacerdote misericordioso e fiel
2ª Parte: 3, 1 – 5, 10
3, 1 – 4, 14: sumo-sacerdote fiel
4, 15 – 5, 10: sumo-sacerdote misericordioso
3º Anúncio: 5, 9-10: A perfeição do sacerdócio de Cristo, princípio de salvação, segundo a ordem de Melquisedec
3ª Parte: 5, 11 – 10, 39
5, 11 – 6, 20: advertência
7, 1-28: Cristo e Melquisedec
8, 1 – 9, 28: a perfeição de Cristo
10, 1-18: o sacrifício de Cristo nos redime
10, 19-35: exortação
4º Anúncio: 10, 36-39: perseverança e fé
4ª Parte: 11, 1 – 12, 13
11, 1-40: a fé
12, 1-13: a perseverança
5º Anúncio: 12,13: orientações para a vida cristã
5ª Parte: 12, 14 – 13, 21
12, 14-29: paz e santificação
13, 1-6: orientações concretas
13, 7-19: as relações na comunidade
13, 20-21: recordação da doutrina e exigências morais
A epístola é um rico testemunho do tom judeu-cristão da Igreja antiga. A epístola faz uma releitura do Antigo Testamento, percebendo-o como prefiguração do Novo Testamento, e mostrando a superioridade deste último.
O tema central da carta é o sacerdócio de Cristo e a sua superioridade sobre o sacerdócio da Antiga Aliança. Acompanhemos o esquema.
Prólogo: 1, 1-4
1ºanúncio 1, 4: Cristo herdou um nome superior aos anjos
1ª Parte 1, 5 – 2, 18
1, 5-14: Cristo glorificado junto com Deus
2, 1-4: breve exortação
2, 5-18: Cristo e sua relação com os homens
2º Anúncio: 2, 17-18: Cristo, Sumo Sacerdote misericordioso e fiel
2ª Parte: 3, 1 – 5, 10
3, 1 – 4, 14: sumo-sacerdote fiel
4, 15 – 5, 10: sumo-sacerdote misericordioso
3º Anúncio: 5, 9-10: A perfeição do sacerdócio de Cristo, princípio de salvação, segundo a ordem de Melquisedec
3ª Parte: 5, 11 – 10, 39
5, 11 – 6, 20: advertência
7, 1-28: Cristo e Melquisedec
8, 1 – 9, 28: a perfeição de Cristo
10, 1-18: o sacrifício de Cristo nos redime
10, 19-35: exortação
4º Anúncio: 10, 36-39: perseverança e fé
4ª Parte: 11, 1 – 12, 13
11, 1-40: a fé
12, 1-13: a perseverança
5º Anúncio: 12,13: orientações para a vida cristã
5ª Parte: 12, 14 – 13, 21
12, 14-29: paz e santificação
13, 1-6: orientações concretas
13, 7-19: as relações na comunidade
13, 20-21: recordação da doutrina e exigências morais
A epístola é um rico testemunho do tom judeu-cristão da Igreja antiga. A epístola faz uma releitura do Antigo Testamento, percebendo-o como prefiguração do Novo Testamento, e mostrando a superioridade deste último.
O tema central da carta é o sacerdócio de Cristo e a sua superioridade sobre o sacerdócio da Antiga Aliança. Acompanhemos o esquema.
- Sacerdote do Antigo Testamento: Pecador - Por isso, se enfatiza a separação do comum dos homens, com ritos, vestes, etc.
- Sacerdote do Novo Testamento: Santo – Por isso a carta aos hebreus enfatiza a humanidade de Cristo: igual aos homens em tudo, exceto do pecado. O pecado não cria comunhão, mas divisão. Cristo não se tornaria mais próximo de nós pecando. O pecado não pertence à natureza humana, por isso Jesus não é menos humano, mas, ao contrário, em virtude de não ter pecado, ele se torna plenamente humano.
Jesus é Sacerdote, porque Ele une em si as duas dimensões, a divina e a humana. É a encarnação de Cristo que o faz sacerdote. Assim, como na vida do sacerdote o ponto alto é o sacrifício, também na vida de Jesus o ponto alto é o sacrifício na cruz, mas toda a vida de Jesus foi sacerdotal.
Diácono Flávio – PSF
Hoje chegamos ao fim do ciclo sobre São Paulo com o último texto assinado pelo Diácono Flávio. Amanhã continuaremos com as Epístolas Pastorais. Não percam!
Epístolas Pastorais (1 e 2 Timóteo; Tito)
As duas cartas a Timóteo e a carta a Tito guardam entre si uma semelhança: são cartas pessoais de São Paulo dirigidas a companheiros de ministérios que agem como bispos das comunidades. Por isso, desde o século XVIII, elas são conhecidas como Epístolas Pastorais.
1. Autenticidade
A questão da autenticidade surge, principalmente, depois do século XIX. Apenas algumas vozes distoantes tinham se levantado no século II, como Marcião e Basílides. Marcião negava a autenticidade das cartas por conta do seu caráter pessoal. Para alguns autores do século XIX, as cartas teriam surgido no século II, com o intuito de combater o gnosticismo e afirmar o episcopado monárquico, no lugar de um governo colegial por parte dos presbíteros. Outros defendiam um fundo paulino nas pastorais, mas estas estariam permeadas de idéias posteriores. Uma grande maioria católica afirma a autenticidade das cartas pastorais. Contudo, acreditam ter havido a intervenção de um redator ou secretário que, segundo algumas opiniões, poderia ter sido Lucas (2 Tm 4,11), o que explicaria as diferenças de vocabulário e estilo presente nas cartas.
Argumentos a favor da autenticidade:
Reconhecimento por parte da Tradição: partes das cartas são citadas por Santo Irineu, no século II, sendo atribuídas a São Paulo;
O caráter das cartas: além de trazer o nome do apóstolo (1-2 Tm 1,1; Tt 1,1), trazem traços específicos de sua personalidade (1 Tm 1,15 – consciência de ser o primeiro dos pecadores); a carta a Tito é dirigida a um companheiro de Paulo do qual se tem apenas vagas notícias em Gálatas e 2 Coríntios, um falsário teria endereçado a carta a um companheiro mais eminente.
Argumentos contra a autenticidade:
A doutrina: alguns autores afirmam que há uma excessiva preocupação jurídica nas cartas (1 Tm 1, 10; Tt 1, 9), o que não próprio do cristianismo de Paulo, que era marcado pela adesão a Jesus Cristo e de fundo profundamente místico (essa afirmação não procede, porque em todo o epistolário paulino encontramos uma parte doutrinal e uma parte exortativa);
Os erros combatidos: alguns autores afirmam que os erros combatidos por Paulo são uma gnose já desenvolvida, como temos no século II – cf. 1 Tm 6, 20 (essa afirmação também não procede, porque problemas de fundo gnóstico Paulo também combate em outras cartas, como o dualismo, por exemplo). Os erros combatidos por Paulo são de fundo judaico (Tt 1, 10; 1 Tm 1, 17): esses movimentos judaicos propagam genealogias e mitos intermináveis (1 Tm 1, 4; 4, 7; Tt 3, 9). Alguns autores defendem que não erros gnósticos que Paulo estaria combatendo, mas desenvolvimentos lendários das narrativas do Pentateuco.
A organização eclesiástica: alguns autores defendem a ideia de que as cartas apresentam uma organização hierárquica própria do século II, quando fala dos bispos, presbíteros e das viúvas. Isso é um engano, porque a carta, embora utilize-se destes termos, não apresenta ainda uma diferença entre bispos e presbíteros. Se a carta tivesse sido escrita no século II, jamais apareceria esse uso indiscriminado de bispo e presbítero, pois, neste período, estas funções já estavam bem definidas.
Datação: Para os que aceitam a autenticidade as cartas teriam sido escritas entre os anos 63 e 67. A 1 Tm de Filipos (1 Tm 1,3); Tt, talvez, logo depois; e a 2 Tm da prisão romana, antes da morte.
2. Teologia
1 Tm – exortação ao destinatário para que, como bispo, defenda os seus fiéis contra a heresia (1, 3-10); exorta-o a nomear colaboradores (3, 1-13); seja modelo para os fiéis (4, 12-16).
2 Tm – exortação a confessar o Evangelho e a fé, mesmo nos tempos difíceis (1, 6-14); exortação a desempenhar com fidelidade o ministério (2, 1-13).
Tt – exortação a garantir a ordem na comunidade por meio da nomeação de bispos e presbíteros (1, 5-9); deve combater as heresias (1, 10-16).
Diácono Flávio – PSF
Os escritos Paulinos – 4º parte
Ainda com São Paulo, vejamos algumas de suas ultimas cartas.
Colossenses
1. A comunidade de Colossos[1]
Colossos ficava na região da Grande Frigia, situada numa área de caráter vulcânico. Eram frequentes as emanações sulfurosas e outras manifestações da natureza que faziam com que os moradores pagãos dessa região venerassem forças ocultas personificadas. A comunidade na foi fundada por Paulo, como ele deixa expresso em Cl 2,1. Em At 2,10 é citada a presença de habitantes da Frígia no dia de Pentecostes, o que pode explicar a existência de um cristianismo pré-paulino nessa região. Durante o período em que Paulo esteve em Éfeso ele poderia facilmente comunicar-se com Colossos e com outras Igrejas vizinhas, como Laodiceia, que é citada na carta. Ao que parece, mesmo não tendo fundado a comunidade, Paulo age com autoridade sobre ela, da mesma forma que age sobre as comunidades que havia fundado. Epafras, citado na carta, teria sido evangelizado por Paulo e se tornado o apóstolo direto de Colossos, que após a morte de Paulo passou para o pastoreio de João, assim como as outras Igrejas da Ásia Menor.
2. Autoria e datação
A carta é uma dêutero-paulina. O problema da autoria se dá em virtude do estilo, do conteúdo e do vocabulário, que se diferencia das proto-paulinas. O estilo é diferente porque neste escrito Paulo muda de assunto rápido, possui um temperamento forte. Com relação ao vocabulário, termos que são próprios de Paulo, como ‘justificação’, ‘justiça’, ‘justo’, não aparecem. Com relação ao conteúdo, alguns temas aparecem abordados de outra forma, como a cristologia que, nas proto-paulinas insiste em falar do Cristo crucificado, e aqui Paulo trabalha mais a questão as pré-existência do Verbo. Com relação à eclesiologia, nas outras cartas Paulo fala mais da comunidade local, aqui Paulo apresenta o termo ‘ekklesía’ numa dimensão universal (cf. Cl 1,8 e 1 Cor 12,12). Alguns também vêem em 4,18, na expressão ‘meu próprio punho’ um apelativo de um outro autor para atribuir a carta a Paulo. Alguns autores vão defender a autoria paulina dizendo que o estilo e o vocabulário não representam um problema em si, uma vez que era o amanuense quem colocava a carta por escrito e poderia, em virtude disso, utilizar-se de um vocabulário próprio. Inclusive a expressão‘meu próprio punho’, para esses autores, não seria um apelativo, mas Paulo que no final do escrito feito pelo secretário ou amanuense queria escrever com sua própria letra a saudação final.
O problema da autoria vai influenciar diretamente na datação da carta. Aqueles que acreditam que a carta aos Colossenses foi escrita por Paulo vão datá-la no período correspondente ao cativeiro em Éfeso ou Roma. Aqueles que acreditam ser a carta não de Paulo, mas da escola paulina, vão datá-la entre os anos 80 ou 90.
3. Estrutura
Introdução e ação de graças: 1, 1-14
1ª Parte – a dignidade de Cristo: 1, 15-29
2ª Parte – as falsas doutrinas: 2, 1-23
3ª Parte – conseqüências morais: 3, 1 – 4, 6
Epílogo: 4, 7-18
4. Conteúdo e teologia
A comunidade de Colossos parece ter uma mistura de gnosticismo, cristianismo e judaísmo. Alguns versículos podem bem nos mostrar essa ideia:
2,8: ‘ninguém vos escravize’; ‘especulações da filosofia’.
2,9: ‘plenitude’ da divindade: não uma centelha.
2,10: ‘nele fostes levados à plenitude: poderia se pensar em um outro acesso a Deus que não por meio de Cristo.
2,11: ‘verdadeira circuncisão’: referência ao mundo judaico.
2,16: ‘comida e bebida’: asceses (gnósticas?); ‘sábados e luas novas’ (mundo judaico).
2,18: ‘culto dos anjos’: elemento gnóstico para ter acesso ao mundo espiritual.
2,19: ‘indagando sobre coisas que viu’ – o termo indagar aqui (embateuo) é próprio dos cultos mistéricos (gnosticismo).
Existiam dois tipos de sistemas gnósticos: os estáticos, onde não se podia ascender de uma à outra casta; os dinâmicos, onde se podia ascender de uma à outra casta através de asceses, jejuns e banhos rituais. Podemos perceber esses elementos na carta.
Existem várias explicações sobre como teria surgido esse sincretismo em Colossos. Alguns acreditam que seja influência da filosofia platônica. Outros afirmam que seriam doutrinas gnósticas que receberam uma roupagem judaica. Outros, ainda, afirmam que seria uma doutrina que acabou assimilando elementos do gnosticismo e das religiões de mistérios.
Vejamos como Paulo responde aos problemas da carta.
A primeira grande resposta de Paulo é chamado “hino cristológico das comunidades da Ásia Menor” de 1,15-20. Paulo afirma que o Verbo encarnado foi o primeiro na intenção de Deus, embora não tenha sido o primeiro na ordem da criação. Tudo foi criado em vista dele e tendo-o como modelo. Depois:
2,9: nele habita ‘corporalmente’ toda a plenitude da divindade (para determinar com qualquer oposição entre corpo e espírito que pudesse haver por conta de uma filosofia platônica).
2,12: co-sepultados (sintaphéntes); co-ressuscitados (sinegérthete); co-vivificados (sinedzuopoiésen – 2,13).
2,28: buscar a verdadeira ‘sabedoria’; ser ‘perfeitos em Cristo’ e não nas práticas ascéticas.
Em resumo, Paulo quer demonstrar que é a partir de Cristo, e não a partir das práticas ascéticas judaicas ou gnósticas, que se deve atingir Cristo.
Filêmon[2]
1. Autenticidade
Trata-se de uma carta pessoal de Paulo, a um cristão que se converteu, muito provavelmente, através da sua pregação (cf. 19). Alguns quiseram negar a autenticidade da carta, talvez por tratar sobre o tema da escravidão sem execrá-la diretamente. Contudo, a maioria dos autores aceita o escrito como verdadeiramente Paulino, esclarecendo que o não negar diretamente a escravidão se dá em virtude do contexto no qual Paulo está inserido.
2. Local e data de composição
Como tratamos na introdução às epístolas do cativeiro, são três as possibilidades:
Éfeso (entre 54 e 57);
Cesaréia (entre 58 e 60);
Roma (entre 61 e 63).
A maioria dos autores não defende a ideia do cativeiro em Cesareia, por ficar longe de Colossos, de onde procedia Onésimo, e ser de difícil acesso. Os autores se dividem principalmente entre estas duas hipóteses: Roma e Éfeso. Roma, apesar de distante, tem o acesso muito facilitado pelo grande fluxo de navios entre a península itálica e Colossos. Em Éfeso, existia o grande Templo de Ártemis, onde era comum os escravos procurarem asilo.
Em virtude de Cl 4,7ss, alguns autores chegaram a afirmar que a carta a Filêmon havia precedido a carta aos Colossenses, que havia sido escrita depois, de um outro cativeiro de Paulo, onde ele trataria mais pormenorizadamente o tema da escravidão.
3. Ocasião e tema principal
Paulo se dirige a Filêmon, um amigo de Colossos, provavelmente convertido através da pregação do apóstolo (v. 19), com o intuito de lhe apresentar Onésimo, um escravo que ele havia convertido na prisão. Onésimo havia sido escravo de Filêmon e estava refugiando-se. Alguns autores chegam a afirmar que Onésimo estaria procurando refúgio junto de Paulo, onde acaba convertendo-se ao cristianismo, segundo o antigo costume grego de procurar refúgio junto aos grandes templos dos deuses. Onésimo também teria achado que, estando junto de Paulo que havia sido o instrumento de conversão de seu patrão a um novo Deus, ele estaria seguro.
Onésimo vem do grego, e significa útil. Era um nome bastante comum para os escravos e pessoas de classe baixa. No v. 11, Paulo faz um trocadilho com outra palavra grega, que também era usada como nome próprio para escravos: Chrestus. Paulo vai dizer que Onésimo que um Achrestus (inútil) e agora seria muito Chrestus(útil). Poderia ver aqui também um trocadilho com o sentido da pronúncia da palavra. Essa se assemelhava ao termo Christos. Paulo estaria dizendo, então, a Filêmon, que Onésimo outrora não era cristão, e agora se tornara outro Cristo, um verdadeiro cristão, por isso lhe seria muito útil, não somente como escravo, mas agora como irmão na fé.
Muitos autores questionam o escrito pelo fato dele não ser uma palavra dura de Paulo a respeito de uma situação a nossos olhos intolerável: a escravidão. Contudo, Paulo quer cristianizar essa relacionamento, uma vez que sabe não poder acabar com ele de uma única vez. Por isso, fala fala a Filêmon que ele agora deve estabelecer um novo nível de relacionamento com Onésimo, não mais o de simples escravo, mas o de irmão na fé.
Efésios
1. A Cidade de Éfeso
Situada na Ásia Menor, a cidade Éfeso recebeu esse nome devido a sua origem mitológica: teria sido fundada por uma amazona homônima, juntamente com a amazona Coresso, que teria dado nome a um importante monte da cidade. A cidade passou pelas mãos de diversas nações que a dominaram, como a Pérsia, a Macedônia etc. Por fim, em 133 a.C., passou pacificamente para as mãos dos romanos, em virtude do testamento do rei Átalo II, último dos reis de Pérgamo.
Em Éfeso ficava situado o importante templo de Ártemis, uma das sete maravilhas do mundo antigo. Ártemis era cultuada em Éfeso como a grande mãe, sendo representada, algumas vezes, com seios numerosos. Em Roma, Ártemis foi identificada com Diana, e seu culto diferenciava-se bastante. Era cultuada em Roma como a deusa da caça, tendo bosques e animais sagrados especialmente a ela dedicados.
O povo de Éfeso vivia sobretudo do Comércio, especialmente nos meses de abril-maio quando, por ocasião das Artemísias (as festas em honra de Ártemis), a cidade se tornava muito movimentada e eram fabricadas pequenas miniaturas do Templo e amuletos que protegiam contra mau-olhado e coisas semelhantes.
2. Destinatários, lugar e data de composição
Já em meados do século II, encontramos a indicação da carta como sendo atribuída “aos Efésios” em Irineu e no Cânon Muratoriano (cópia da lista mais antiga que se conhece dos livros do Novo Testamento). Contudo, segundo outros manuscritos antigos, não existe essa indicação da carta como sendo atribuída aos Efésios (cf. 1,1). Também Orígenes, S. Basílio e S. Jerônimo comentam a falta dessa indicação em manuscritos do seu tempo. Parece realmente estranho o fato de Paulo, mesmo depois de ter passado três anos em Éfeso, não relatar na carta nenhuma relação pessoal com os habitantes da cidade. Por outro lado, temos em Tertuliano, uma indicação que a carta seria, originalmente, dirigida aos Laodicenses. Assim sendo, temos três opiniões com relação aos destinatários da carta:
1º) Primeiro, os que defendem a autoria paulina;
2º) Depois, aqueles que acreditam que a carta era originalmente dirigida aos Laodicenses (seria a carta perdida, da qual fala Cl 4,16). Ela teria sido tardiamente atribuída aos Efésios por causa da passagem de Ap 3, 14-22, que fala que a Igreja de Laodicéia estava para ser cuspida ou vomitada da boca de Deus;
3º) Outros ainda, veem na carta aos Efésios uma carta circular, destinada a todas as comunidades da Ásia Menor. O destinatário ficaria em aberto, devendo ser preenchido com o nome de cada comunidade. Em virtude de ser Éfeso a capital da província romana da Ásia, o escrito acabou tradicionalmente atribuído a esta comunidade.
Quanto ao lugar e à data de composição, temos duas hipóteses:
1º) Para os que aceitam a autenticidade: teria sido escrita de Roma, no primeiro cativeiro, e sido enviado por Tíquico, assim como a carta aos Colossenses (Ef 6,21-22; Cl 4,7-8).
2º) Para os que não aceitam a autenticidade: a menção ao cativeiro seria falsa e a carta teria sido escrita de algum lugar da Ásia Menor, por volta do final do século I.
3. Estrutura
Introdução: 1,1-2
Parte Dogmática (encerrada pela doxologia de 3,20): 1,3 – 3,21
Parte Exortativa (aplicação da doutrina à vida prática): 4,1 – 6,20
Epílogo: 6,21-24
4. Relação com Colossenses
a) Semelhança na linguagem;
b) Formas hínicas (Cl 1, 15-20; Ef 1, 2-14);
c) Temas comuns:
Cristo, cabeça da Igreja (Cl 1,18; Ef 1,22s);
Paz pelo sangue da cruz (Cl 1,20; Ef 2,14-15);
d) Dependência literária (Cl 1,25 / Ef 3,2; Cl 1,26 / Ef 3, 3-5; Cl 2,19 / Ef 4,15-16);
e) Efésios sintetiza textos de Colossenses (Ef 1,7 / Cl 1,14.20)
f) Efésios parece desenvolver alguns temas de Colossenses (Ef 5,22 – 6,9 e Cl 3,18 – 4,1)
Como Efésios é mais extensa e desenvolve melhor alguns temas, alguns autores afirmam que ela teria se servido de Colossenses e seria posterior a ela.
Ainda hoje, as Cartas Pastorais. Não percam!
Diácono Flávio – PSF
[1] Cf. Ballarini. Introdução à Bíblia. Vol.V/2. pp. 62-63
[2] Cf. Teodorico Ballarini. Introdução à Bíblia. Vol. V/2.pp. 467-473
Vamos continuar?!
Gálatas
1. Destinatários
Os assim chamados gálatas eram, no início, tribos célticas que deixaram a região da Gália e se estabeleceram no centro da Ásia Menor. Nessa região essas tribos viveram durante algum tempo sob os seus próprios chefes até que em 25 a.C. Augusto agregou a região da Galácia ao domínio romano criando assim a província romana da Galácia que abrangia um imenso território: ao Norte, até quase o Mar Negro; e ao Sul, até quase o Mediterrâneo. O centro desta província romana era Ancira. Quando se fala dos Gálatas tanto podemos estar falando do território menor onde se instalaram as tribos vindas da Gália ou de todo o território da província romana. Algumas passagens podem nos mostrar em que região Paulo pensava quando falava da Galácia. Em At 16,6 e 18,23 Paulo faz distinção entre as regiões da Frígia e da Galácia, o que nos mostra que ele está pensando na Galácia do Norte, a região mais restrita, e não na província romana da Galácia, a região mais ampla. A cultura greco-romana se estabeleceu na região da Galácia e por isso ali Paulo pode também pregar o evangelho.[1]
2. Datação
Paulo esteve duas vezes na região da Galácia: na segunda viagem missionária (At 16,6) e na terceira viagem missionária (At 18,23). Em 4, 13 Paulo fala que, em virtude de uma doença, visitou os Gálatas pela primeira vez. Logo, ele deve ter escrito a carta durante a terceira viagem missionária, de Éfeso ou de Corinto, onde ele esteve por mais tempo sem viajar. Gl 1,6 parece nos dar uma data mais precisa quando Paulo fala que os Gálatas foram evangelizados e logo estão dando ouvidos à outra coisa. Em virtude disso, os estudiosos acreditam que é mais provável que Paulo tenha escrito de Éfeso e não de Cesaréia, três anos mais tarde. Aqueles que acham que Paulo quando fala da Galácia está se referindo à Galácia maior preferem datar a carta depois da primeira viagem missionária (escrita talvez em Filipos entre os anos 51-52). Aqueles, porém, que acreditam que Paulo está se referindo à Galácia menor datam a carta como tendo sido escrita em Éfeso entre os anos 54-55.
3. Estrutura
Saudação e admoestação: , 1-10
Primeira Parte ( Seção Autobiográfica): 1, 11 – 2, 21
Segunda Parte (Seção Dogmática): 3, 1 – 4,31
Terceira Parte (Seção Exortativa): 5, 1 – 6,10
Epílogo: 6, 11-18
4. Características Teológicas
O grande problema que Paulo enfrenta na comunidade dos Gálatas é a controvérsia com os “judaizantes”. Em Gl 1, 6-7 Paulo fala de alguns que estão “perturbando” os cristãos da Galácia. Esse verbo “perturbar” que Paulo usa é muito importante para entendermos quem são os judaizantes. Paulo aqui utiliza o verbo grego tarasso que significa “perturbar”, mas não somente “perturbar” no sentido de “causar algum incômodo”, mas “perturbar” aqui tem uma conotação política e significa “subverter a ordem estabelecida”. Logo, os judaizantes são pessoas que vêm de fora da comunidade para subverter aquilo o que Paulo já havia estabelecido. Podemos ver em várias passagens que Paulo questiona a atitude dos judaizantes (cf. 1, 6-7; 3,1; 5,10).
Esses perturbadores que vêm de fora querem impor aos Gálatas, que vieram do paganismo (4, 8-10), a adotar os costumes judaicos. Os judaizantes acreditavam que, mesmo aqueles que aderiram a Jesus deveriam continuar praticando ao lado do cristianismo todos os costumes judaicos, como a circuncisão, as leis dietéticas etc. Eles se apresentam como os verdadeiros anunciadores do evangelho e se opõem veementemente a Paulo fazendo contra ele diversas acusações. Daí podemos entender porque Paulo fala que os gálatas passaram a um “outro evangelho” em 1,6 e afirma que ele mesmo está submisso ao evangelho que anuncia (cf. 1,8).
O problema dos judaizantes é o problema da justificação. Vejamos um pouco o tema da justificação[2]:
Antigo Testamento: na terminologia jurídica do AT, o juiz “justifica”, declara alguém inocente. Justificar é, portanto, absolver alguém no tribunal. Esse alguém que é absolvido deve ser inocente, caso contrário seria uma perversão da justiça. De maneira particular, o Servo de Javé parece representar um estilo próprio de justificação, segundo o qual, diferentemente da lei comum, o pecador seria declarado inocente. É quase como se fosse um lampejo do que se desenvolverá na teologia paulina da justificação. No judaísmo, e especificamente em Qumran, antes da doutrina farisaica da justificação, já se acentuava o papel de Deus neste processo e o termo ganhou, por vezes, o sentido de perdão e reconciliação.
Novo Testamento: Aqui o autor do verbete destaca três momentos: a pregação de Jesus, a teologia paulina e Tiago. Vejamos em primeiro lugar a pregação de Jesus:
Pregação de Jesus: A pregação de Jesus parece destacar de maneira especial os pecadores. Estes, se forem humildes, são mais aptos a receber a justificação do que os fariseus que já se consideram justificados.
Teologia paulina: O texto do Barbaglio[3], apresenta uma análise das expressões utilizadas por Paulo quando fala da justificação. Antes de traçar a teologia paulina sobre a justificação, convém ressaltar alguns pontos da terminologia. Em primeiro lugar, Barbaglio destaca a expressão “justiça de Deus”, que aparece apenas na carta aos Romanos, querendo de maneira indireta afirmar a expressão “ser justos pelo dom de Deus”. Também os termos “justificar”, “ser justificados” aparecem em Gl e Rm, indicando que os beneficiários da ação justificadora são, em primeiro lugar, Abraão, e depois todos os homens, judeus e pagãos. Nega-se a lei mosaica com as suas obras de observância. Há uma antítese: não à justificação pelas obras e sim à fé. Também os termos justiça e justificação aparecem em Gl, Rm e ainda em Fl e 1 Cor. Referindo-se à Gn 15,6, Paulo mostra que Deus credita como justiça a fé. A justificação é expressada como resultado da ação salvadora de Cristo (cf. Fl 1,11; 1 Cor 1,30 etc.). O adjetivo justo, por fim, em apenas um texto (Rm 3,26) é atribuído a Deus e poucas vezes é atribuído ao homem.
O ponto de partida de Paulo é a sua concepção de pecado, uma vez que a justiça exclui o pecado e a justificação inclui o perdão dos pecados. Segundo o pensamento paulino, antes de Cristo, todos, judeus e pagãos, estavam sob o jugo do pecado e incapazes de justificar-se. O tema da justificação em Paulo desenvolve-se sobretudo nas suas polêmicas com os judaizantes. Até mesmo o seu vocabulário deve ter sido retirado desse uso legalista comum aos judaizantes. Segundo o sistema farisaico da justificação, que superexaltava a observância da lei em detrimento da misericórdia de Deus, depois da morte o justo receberia a sua recompensa, por ter ele mesmo, por suas própria capacidades, observado toda a Lei. Era o sistema da balança: para onde a balança tender Deus é obrigado a proferir a sentença. As escolas de Hilel e Shamai, chegavam até a discutir sobre o que aconteceria caso obras boas e más se igualassem. A justificação era assim uma espécie de recompensa, um sistema forense onde Deus reconhece apenas uma realidade já existente. Paulo opôs a esse sistema a justiça cristã, segundo a qual, é Cristo quem justifica o homem pela fé. Enquanto o sistema farisaico queria pôr no mesmo patamar a fé e a observância da Lei, Paulo demonstra a supremacia da fé. A própria fé é também um dom de Deus, o que já havia sido destacado por Fílon e Qumran. Paulo chega a citar o exemplo de Abraão, como aquele que teve a “fé” imputada como justiça. Paulo demonstra então, que a justificação é um dom de Deus e não um produto do esforço humano.
Tiago: Aparentemente há uma oposição formal entre Tiago e Paulo, uma vez que aquele aplica às obras um lugar de maior destaque. Essa concepção levou Lutero a rejeitar o escrito de Tiago. Já os Padres puderam perceber o que hoje nos parece claro, a saber, que não há de fato oposição, o que há é uma outra forma de entender fé, obras e justiça. As obras em Tiago não são as “obras da Lei”, mas obras de caridade (hospitalidade, religiosidade etc.). O que Tiago chama de “fé morta” é a aceitação puramente intelectual da verdade, sem que isso implique num envolvimento ou numa mudança da vida. A justiça para Tiago é a conformação entre a vida e a doutrina. A Lei ele a entende no espírito do Sermão da Montanha, onde esta se torna uma lei de liberdade. Segundo Chaine, Tiago talvez queira combater uma visão errônea da doutrina paulina sobre a justificação, segundo a qual alguns diriam que é possível se salvar somente pela fé, sem praticar as virtudes cristãs.
Paulo se opõe à esse sistema farisaico da balança mostrando que a justificação não é:
Jesus Cristo + Lei = Salvação
E, sim:
Jesus Cristo = Salvação (a Lei é consequência da adesão a Jesus Cristo).
A Lei, para Paulo, exerce uma dupla função:
Em primeiro lugar a Lei foi dada em virtude das transgressões do povo. A Lei, todavia, não ajuda o homem a vencer o pecado. Ele deve então voltar a Abraão, à fé.
Em segundo lugar, a Lei guarda para a fé. Ela é pedagoga. Com o advento de Cristo a Lei já alcançou o seu objetivo.
Quando praticamos a Lei não a praticamos achando que é ela quem nos salva. A salvação vem pela graça de Cristo. O nosso seguimento da Lei é somente a expressão de quem aderiu à salvação.
Filipenses
1. Destinatários[4]
Esta cidade recebeu o nome do rei Filipe II da Macedônia, pai de Alexandre Magno, que a fundou e construiu. Paulo esteve em Filipos durante a 2ª viagem missionária (At 16, 12-40), entre os anos 50 e 51. Filipos não tinha uma sinagoga, o que indica que a população judaica na região era pequena. Quando chega na cidade Paulo encontra Lídia, comerciante de púrpura, num pequeno lugar de oração que havia em Filipos. Paulo e Silas teriam expulsado um espírito maligno de uma adivinha, que o levou diante do tribunal sendo, por isso, açoitado e preso, mas somente por uma noite (teria sido o primeiro cativeiro paulino) e depois teria sido despedido da cidade depois de ter conseguido desculpas das autoridades pelo fato de terem açoitado um cidadão romano. Paulo esteve ainda mais duas vezes na comunidade: durante o outono de 57, na terceira viagem missionária; depois na Páscoa de 58 (At 20,6). Parece ser uma comunidade com a qual Paulo mantinha íntimos laços fraternos. Somente dela Paulo aceita ajuda material e não teme ser tido como interesseiro (Fl 4,15s; 2 Cor 11,9).
2. Estrutura
Introdução: 1, 1-2 (saudação); 1, 3-11 (ação de graças)
I. Notícias Pessoais: 1, 12-16
II. Exortações: 1,27 – 2,18
– fé e humildade:1,27 – 2,11 (2,6-11: hino)
– trabalhar pela salvação: 2,12-18
III. Notícias Pessoais: 2,19 – 3,1
IV. Advertências e exortações: 3,2 – 4,1
V. Exortações Finais: 4,2-9
VI. Agradecimentos: 4,10-20
VII.Saudações e bênção final: 4,21-23
3. Teologia da carta (análise de 2, 6-11)
Testemunho da união entre Paulo e a comunidade.
Exortação à concórdia e humildade, seguindo o exemplo de Cristo (2, 5-11).
Carta da alegria: 1,4.18.25; 2,2.17s.28s; 3,1; 4,1.4.10. Mesmo no cárcere.
Os estudiosos dedicam um especial interesse ao hino de Fl 2,6-11. Os autores afirmam não ser de Paulo, mas sim um hino já conhecido na comunidade primitiva que assim entendia o mistério da encarnação de Cristo e a sua exaltação e que Paulo teria aproveitado na sua carta, com algumas variantes que trazem a sua marca (“morte de cruz” e “para a glória de Deus Pai”).
Amanhã, continuamos com São Paulo. Nos vemos lá!
Diácono Flávio – PSF
[1] Cf. Karl Hermann Schelkle. op. cit. pp. 133
[2] Cf. G. BARBAGLIO, As cartas de Paulo. II. São Paulo, 1991, p. 292-296; J. GNILKA, Teologia del Nuevo Testamento. Madrid, 1998, p. 82-93; A. VAN SCHAIK, “Justificação”, in A. VAN DEN BORN (org.)Dicionário Enciclopédico da Bíblia. Petrópolis, 1977, col. 861-866
[3] G. BARBAGLIO, As cartas de Paulo. II. São Paulo, 1991, p. 292-296
[4] Cf. Karl Hermann Schelkle. Teologia do Novo Testamento. pp. 163-164
Agora, os textos à comunidade de Corintos.
1 e 2 Coríntios
1. A cidade de Corinto
A Corinto à qual Paulo escreve mais ou menos em 50 d.C. é uma Corinto reconstruída por Júlio César em 44 a.C. depois que havia sido completamente saqueada e destruída em 146 a.C. Com Júlio César, Corinto se torna capital romana da província da Acaia que era uma cidade importante e privilegiada por muitos motivos. Entre estes motivos podemos destacar a sua posição privilegiada no istmo[1] que fazia com que Corinto tivesse portos dos dois lados: um que se dirigia para o Oriente, abrindo caminho para a Ásia; outro que se dirigia para o Oriente, abrindo caminho para o comércio com a Itália e outras regiões do Ocidente. Assim, a cidade é o lugar de passagem desses navios e também dos seus tripulantes. Por sua posição privilegiada no Istmo, era também o lugar onde se realivam os chamados “Jogos Ístmicos” em honra a Netuno (Poseidon), quase tão famosos quanto as Olimpíadas e que atraíam um grande público à cidade.
Corinto era conhecida ainda pela sua depravação moral. Existia na cidade um templo dedicado a Afrodite, no qual, segundo Estrabão existiam mil hieródulas (homens e mulheres que em certos santuários pagãos da antiguidade se dedicavam à prostituição) que haviam sido dedicadas a deusa como escravas por homens e mulheres ricos da cidade. Segundo Estrabão, estas mulheres eram um grande motivo de atração para a cidade, porque os marinheiros que ali passavam deixavam muito do seu dinheiro. Segundo Rinaldo Fabris[2], nas escavações que têm sido feitas em Corinto se encontram apenas os restos de um pequeno templo dedicado a deusa que não poderia abrigar as mil hieródulas das quais fala Estrabão. Ele acredita que estes escritos tinham o intuito de aumentar a má fama que a cidade já possuía nas redondezas. Fato é que já no século V a.C. Aristófanes, um importante escritor grego, utiliza o termo korinthiázestai, ou seja, “viver à maneira coríntia”, como sinônimo de “fornicar” e, também, Platão, naRepública, utiliza a expressão korinthia korê, ou seja, “uma jovem coríntia”, como sinônimo de prostituta.
2. As Epístolas aos Coríntios
Pela que podemos perceber da leitura das duas cartas aos Coríntios, Paulo deve ter escrito na verdade quatro cartas, que chamaremos aqui de ABCD[3].
Depois da pregação em Atenas, onde havia conseguido muito pouco (At 17,34), Paulo chega a Corinto, no outono de 51 d.C., durante a segunda viagem missionária (At 18, 1-17). Paulo fica em Corinto cerca de 18 meses e lá consegue reunir uma comunidade considerável, apesar da oposição dos judeus daquela cidade que queriam que Galião, procônsul da Acaia, impedisse a pregação de Paulo.
Durante a terceira viagem missionária (54-57), Paulo permanece de dois a três anos em Éfeso, defronte a Corinto. O Mar Egeu possuía um tráfego intenso e ligava estas duas importantes cidades. É de lá que Paulo envia as suas quatro cartas aos coríntios, das quais somente duas se conservaram com certeza dentro do Novo Testamento, a Coríntios B (conhecida por nós como 1 Cor) e a Coríntios D (conhecida por nós como 2 Cor). Como veremos adiante existem algumas hipóteses segundo as quais as cartas A e C estariam dentro das cartas B e D. A existência de uma carta anterior à que chamamos de 1 Cor e que aqui designamos como Coríntios A se deduz das seguintes passagens: 1 Cor 5, 9.11. Aqui Paulo menciona uma carta anterior à 1 Cor. Essa carta teria sido mal interpretada pelos Coríntios fazendo com que Paulo escrevesse a Coríntios B (a nossa 1 Cor). Por ter sido mal interpretada a Coríntios A teria se perdido ou ficou conservada dentro da Coríntios B (1 Cor). Ao que tudo indica, entre a Coríntios B e a Coríntios D, teriam surgido falsos pregadores na comunidade de Corinto que teriam causado um certo estremecimento nas relações entre Paulo e a comunidade. Isso fez com que Paulo fizesse uma visita à comunidade que não está mencionada nos Atos dos Apóstolos, mas que podemos deduzir de 2 Cor 2,1, 2 Cor 12,14 e 13,1. Na primeira citação Paulo fala que não quer ir ter denovo com a comunidade na tristeza. Ora, a primeira visita não foi na tristeza porque foi a visita da fundação. Essa segunda visita só pode ser a intermediária que gerou a Coríntios D (2 Cor). Nas outras duas passagens Paulo fala que irá ir visitar a comunidade pela terceira vez.
Para alguns estudiosos a Coríntios A estaria dentro da 2 Coríntios (6,14 – 7,1) e a Coríntios C também (10 – 13).
3. Estrutura e características teológicas da 1 Coríntios[4]
Introdução: endereço e ação de graças (1, 1-9)
I. Divisões e escândalos: 1,10 – 6,20
II. Questões diversas tocadas pelos Coríntios: 7,1 – 14,40
III. A Ressurreição dos mortos: 15, 1-58
Alguns autores questionaram a unidade da carta em virtude da diversidade de temas. Essa diversidade é justificada em 7,1, onde Paulo diz que está escrevendo para responder às dúvidas levantadas pelos Coríntios. Ao que tudo indica, os Coríntios escreveram uma carta para Paulo, onde lhe fizeram muitos questionamentos que ele busca responder no capítulo 7 e seguintes.
Vejamos os principais pontos doutrinais da carta.
a. Os partidos da Igreja de Corinto: alguns se diziam de Paulo, outros de Apolo, outros de Cefas e outros de Paulo (cf. 1, 10 – 4,21). A este problema Paulo responde afirmando que todos os pregadores estão submetidos ao único Senhor que é Cristo, não devendo então existir facções dentro da Igreja de Cristo.
b. Problemas Morais: o apóstolo manifesta a sua tristeza pelo caso de incesto dentro da comunidade cristã de Corinto (5, 1-13). Paulo responde a esse problema com uma teologia do corpo, mostrando que o corpo do cristão não é mais sua propriedade, mas de Cristo (6, 12-20).
c. O uso dos carismas: os dons carismáticos como a glossolalia eram muito comuns na Igreja de Corinto. Os capítulos 12 – 14 da 1 Coríntios não têm como objetivo vetar o uso dos carismas, mas orientar a comunidade a respeito do essencial. Os três capítulos formam uma estrutura que denominamos quiasmo[5]:
a. Cap. 12: uso dos carismas
b. Cap. 13: hino à caridade
a’. Cap. 14: novo uso dos carismas a partir do critério do cap. 13 (a caridade é a medida dos carismas)
d. A Ressurreição dos mortos: como podemos verificar em 15,12, alguns Coríntios duvidavam da ressurreição dos mortos. Como constatavam que depois da morte o corpo se decompõe alguns diziam que não era necessário acreditar na ressurreição dos corpos. Esses que contradiziam a doutrina da ressurreição dos corpos diziam que bastava uma ressurreição espiritual e acreditavam que todos aqueles que já haviam aderido a Cristo pela fé batismal se encontravam de antemão ressuscitados. Os Coríntios acreditavam que as manifestações espirituais que aconteciam nos grupos de oração eram uma prova visível de que eles já haviam ressuscitado, logo não colocavam a sua esperança numa ressurreição futura, mas no fato presente de que já estavam em comunhão definitiva com Cristo. Paulo combate o erro dos Coríntios afirmando o fato da ressurreição de Cristo. Se em Adão todos morrem em virtude da sua solidariedade com ele, também no novo Adão, Cristo, todos vivem, em virtude da graça que Ele nos transmite.
4. Estrutura e características teológicas da 2 Coríntios[6]
Introdução: 1, 1-11
1ª Parte: 1,12 – 7,16 – Incidentes passados – Parte Apologética
2ª Parte: 8,1 – 9,15 – Organização da coleta em favor da Igreja de Jerusalém – Parte Exortativa
3ª Parte: 10, 1 – 13, 10 – Apologia de Paulo – Parte Polêmica
Conclusão: 13, 11-13
Como podemos ver acima, a 2 Coríntios se divide em três partes bem distintas. Na primeira parte temos o contraste entre a alegria de Paulo pelo apaziguamento da sua relação com os Coríntios e a defesa que ele precisa fazer de si mesmo diante dos adversários. Na segunda parte, que é basicamente exortativa, Paulo fala da doação à Igreja de Jerusalém. Assim como Cristo se fez pobre para nos enriquecer nós devemos dar livremente o que é necessário para os irmãos (8,9). Na terceira parte temos uma outra controvérsia com os adversários onde Paulo faz a sua apologia, trazendo em seu favor as diversas dificuldades que ele enfrentou pelo Evangelho.
Ao que tudo indica o tema da polêmica com os falsos apóstolos ocupa um bom espaço dentro da 2 Coríntios. Alguns autores, principalmente protestantes, quiseram achar que Paulo se referia aos doze apóstolos, como se fossem eles os seus opositores. Essa suposição hoje não encontra mais aceitação, tendo em vista que em outros escritos, Paulo demonstra claramente a sua amizade e comunhão com os outros apóstolos. Esses adversários acusam Paulo de falta de energia (10,1.10); de incapacidade de falar (11,6); falta de caráter (1,17); covardia (4,1.16); apetite de dominação (1,24; 4,5); abuso do seu cargo (2,17; 10,14). Paulo se defende destes ataques especialmente nos capítulos 10-13, onde tece a sua apologia afirmando ser também ele hebreu (11,21); arroga em seu favor as inúmeras desditas pela qual passou (11, 23-33).
Hoje a noite continuamos com a terceira parte dos escritos Paulinos. Até mais!
Diácono Flávio – PSF
[1] Faixa de terra que liga um península a um continente.
[2] Rinaldo Fabris. Pablo, El Apóstol de las gentes. Paulus, p. 280. Cf. também Teodorico Ballarini. Introdução à Bíblia. pp. 216-218:“Embora fosse Corinto rica em muitos atrativos, nenhum deles superava o fascínio exercido pela deusa da luxúria: ‘Nenhuma cida possui, para atrair os homens de qualquer raça, atrativos mais poderosos: trata-se da cidade de Afrodite’, dizia Hélio Aristides”.
[3] Cf. Karl Hermann Schelkle. op. cit. pp. 139-141
[4] Cf. Maria de Lourdes Corrêa Lima (apontamentos de aula); cf. também: Karl Hermann Schelkle. op. cit. pp. 142-147; cf. também: Rinaldo Fabris. Pablo, El Apóstol de las gentes. Paulus, p. 385ss
[5] Quiasmo: uma estrutura literária onde temos uma premissa “a” que é modificada por uma premissa “b” que gera uma nova premissa denominada “ a’ ”, que é justamente “a” modificada por “b”.
[6] Cf. Maria de Lourdes Corrêa Lima (apontamentos de aula); cf. também: Karl Hermann Schelkle. op. cit. pp. 142-147; cf. também: Rinaldo Fabris. Pablo, El Apóstol de las gentes. Paulus, p. 385ss
A Carta aos Romanos
1. Ensejo
Paulo não conhecia pessoalmente a comunidade e escreve para se apresentar, pois como evangelizador dos gentios pretendia chegar até a capital do Império e daí, atingir a Espanha (Rm 15,24). Como a carta não foi motivada por nenhum problema especificamente doutrinal daquela comunidade, Paulo procura no texto apresentar a sua doutrina. Por isso ele a chama de “meu evangelho”.
2. Datação e local
A carta foi escrita pelo fim da terceira viagem missionária (53-58). Ela foi escrita de Corinto no inverno de 57/58 (1 Cor 16,6). A carta aos romanos, já antes do ano 100 é conhecida e aceita pelas comunidades cristãs.
3. Estrutura
Introdução: 1, 1-17
Parte I: Dogmática – A Salvação mediante a fé em Cristo (1, 18 – 11,36)
Parte II: Exortativa – Exigências morais da “justiça de Deus” (12,1 – 15,13)
Epílogo: 15,14 – 16,24
Doxologia Final: 16,25ss
4. Teologia
Como vimos acima a carta possui uma parte doutrinal-dogmática (1,18 – 11,36) e uma parte exortatório-prática (12,1 – 15,33).
Na primeira parte Paulo apresenta o tema da justiça de Deus e a justificação do homem. Ele demonstra como o homem não pode ser justificado pelas suas próprias forças e que tanto judeus como pagãos são pecadores (1,18 – 3,20). A justiça é obra salvífica de Cristo (3, 21 – 4,25. Emblemática é a passagem de Rm 3, 25-26 em que Paulo vai falar que Cristo é o “instrumento de propiciação”. Aqui ele utiliza a palavra grega hilastérion, que corresponde à palavra hebraica kappóreth, que designava a tampa da arca da aliança que ficava no Santo dos Santos, do outro lado da cortina do Templo. Lá o Sumo-Sacerdote entrava uma única vez, no dia da Expiação, Yôm Kippur, e aspergia com o sangue das vítimas ohilastérion, para obter para o povo e para si o perdão dos pecados através do mesmo gesto que fez Moisés aos pés do Sinai (Ex 24, 1-11; 25, 17.18; Lv 16,14)[1].
Na perícope que vai de 9,1 – 11,36 Paulo fala sobre a justificação dos judeus, mostrando como eles sempre procuraram conseguir mediante as obras da Lei a justiça perante Deus.
Esta primeira parte é muito semelhante à carta aos Gálatas, do ponto de vista doutrinário. Paulo não prega nada que esteja em desacordo com o Evangelho. Ele anuncia que ninguém pode justificar-se a si mesmo (Jesus também o faz em Lc 13, 1-5). Paulo afirma a justificação do pecador como sendo um dom de Deus (3, 24) e também Jesus Cristo o faz na passagem do publicano (Lc 18, 9-14).
Na segunda parte Paulo dá mais conselhos práticos, como o domínio de si (12, 1-21); a obediência às autoridades constituídas (13, 1-7); o amor como cumprimento da Lei (13, 8-10) etc.
Paulo mostra, no dizer de Karl Hermann, a inutilidade tanto do judaísmo como do paganismo. A tentação pagã é alcançar Deus pelo próprio esforço e a tentação judaica é tornar Deus seu devedor em virtude do cumprimento das obras da Lei. Os dois caminhos são inúteis, porque o homem não pode salvar a si mesmo, devendo abrir-se à salvação unicamente como dom de Deus.
I Tessalonicenses
1. A comunidade de Tessalônica
A cidade de Tessalônica foi fundada em 316-315 a.C. por Cassandro, general de Alexandre Magno. A cidade recebeu o nome de Tessalônica em homenagem à mulher Cassandro Thessalonikê, irmã de Alexandre Magno. Tessalônica, por ficar na desembocadura de três importantes rios[2] se converte no porto principal da Macedônia. Foi conquistada pelos romanos em 146 a.C. e eleita como capital da grande província da Macedônia. Paulo e Silas encontram em Tessalônica uma forte comunidade judaica. No ano 380 d.C. Teodósio proclamará de Tessalônica o Edito que tornará o cristianismo a religião oficial do império.
2. Paulo em Tessalônica
Em At 16 vemos Paulo e Silas evangelizando Filipos. Eles fogem de lá e chegam à Tessalônica (At 17,1). Paulo encontra uma forte comunidade judaica em Tessalônica que se reúne todos os sábados na sinagoga. Ali Paulo se mantém com seu próprio trabalho de tecelão. Ele prega durante três sábados consecutivos na sinagoga e não é bem aceito. Paulo busca mostrar aos judeus pelas próprias Escrituras que o Messias devia ressuscitar dos mortos, e que este Messias é o Cristo (At 17, 3). A grande maioria dos judeus não aceita a pregação de Paulo, somente um pequeno grupo, onde se destaca Jasão, que hospeda Paulo em sua casa. Com a perseguição em Tessalônica, Paulo vai à Beréia (At 17, 11-14) e depois a Atenas (At 17, 15-34). Encontrando-se em Atenas com Timóteo Paulo o envia a Tessalônica e parte para Corinto. Paulo permanece em Corinto dezoito meses e durante este período Timóteo desce de Tessalônica para Corinto para dar notícias da comunidade a Paulo, o que dá ensejo à carta ( 1 Ts 3,6).
3. Autenticidade, local, destinatários
Quanto a autenticidade temos tanto dados internos, quanto externos. O testemunho externo está expresso na Didaqué, nas cartas de Santo Inácio de Antioquia, na carta de Policarpo, no Pastor de Hermas, em Santo Irineu e outros. O testemunho interno é dado pelo estilo da carta e pelo vocabulário, que são propriamente paulinos.
Quanto ao local e datação, a carta foi escrita durante a segunda viagem missionária, quando Paulo está em Corinto, mais ou menos entre os anos 50-51. Paulo está em Corinto entre os anos 50 e 52 por aí ele encontra Áquila e Priscila (At 18,2) que acabavam de chegar de Roma em virtude do edito de Cláudio que ordenava a saída de todos os judeus de Roma (o edito foi proclamada em 49 ou 50, se Paulo ficou 18 meses em Corinto ele ficou lá entre os anos 50 e 52).
Os destinatários são os habitantes de Tessalônica evangelizados por Paulo durante esta mesma viagem missionária. Os cristãos de Tessalônica parecem ser, na sua maioria, oriundos da gentilidade, uma vez que os Atos dos Apóstolos nos relatam que a maioria dos judeus não aceditaram a mensagem de Paulo.
4. Estrutura
Introdução: 1, 1-10
1ª Parte – Paulo e os tessalonicenses: 2, 1 – 3, 13
2ª Parte – Exortações morais e doutrinais: 4, 1 – 5, 22
3ª Parte – diversas recomendações: 5, 12-22
Conclusão: 5, 23-28
5. Teologia
Podemos dividir a 1 Ts em dois blocos: o primeiro de 1, 2 – 3, 8 (fala sobre a estada de Paulo em Tessalônica e o seu relacionamento com essa comunidade; o segundo 3, 9 – 5, 24 (parte doutrinal, com admoestações). Por ser talvez o escrito mais antigo de todo o Novo Testamento, a carta não realiza altas considerações teológicas. Paulo utiliza uma linguagem simples, como aquela do pai para os seus filhos.
Paulo trabalha na carta um problema específico que surge em Tessalônica: a parusia. Os cristãos de Tessalônica esperavam que Cristo voltasse enquanto eles ainda viviam. Com a morte de cristãos antes da tão esperada segunda vinda de Cristo começa a surgir no meio da comunidade a pergunta sobre aqueles que ‘adormeceram’[3] em Cristo. Qual será o seu destino? Paulo responde a esse questionamento dos tessalonicenses mostrando que, quando Cristo vier, os mortos ressuscitarão e os que estiverem vivos se encontrarão com Ele nos ares. Paulo utiliza um rico simbolismo comum ao mundo judaico e quiçá alguns elementos que refletem uma realidade também conhecida no mundo pagão: a forma como o Imperador era recebido por ocasião da sua parusia, ou seja, da sua visita a determinada localidade. Assim Paulo anima a comunidade a respeito daqueles que morreram e também os anima a enfrentar com alegria a perseguição desencadeada pelos mesmos judeus que o perseguiram quando evangelizou a comunidade.
II Tessalonicenses
1. A questão da autenticidade e a datação
Embora a carta seja aceita pela Tradição como sendo paulina, segundo o testemunho de Plicarpo (156), Justino (165) e outros, existe ainda a discussão a respeito da sua autenticidade. Podemos dividir a questão da autenticidade em três pontos:
a) A carta apresenta muita semelhança com a 1 Ts como podemos segundo a tabela abaixo:
1 Ts | 2 Ts |
1,1 | 1, 1-2 |
1,2 | 1,3 |
2,12 | 1,5 |
2,13 | 2,13 |
3,13 | 1,7 |
3,11-13 | 2,16-17 |
5,14 | 3,6 |
5,23 | 3,16 |
5,28 | 3,18 |
Aqueles que negam a autenticidade da carta vão dizer que estes pontos de semelhança indicam um plágio, ou seja, alguém teria escrito uma outra carta atribuindo-a a Paulo, por isso teria usado a mesma linguagem e conceitos semelhantes. Longe de ser um testemunho contra a autenticidade, este é um testemunho a favor da autenticidade, porque esta semelhança de vocábulos e conceitos liga o escrito ao corpo paulino.
b) Outros apresentam como argumento contra a autenticidade a diferença de tom de Paulo neste segundo escrito. Na primeira carta Paulo aparece mais cordial, mais próximo da comunidade. Aqui Paulo aparece mais distante. Esta diferença de estilo de Paulo se explica pelo contexto diferente da carta. Na 1 Ts Paulo deveria consolar a comunidade aflita a respeito daqueles que morreram sem ver a parusia do Senhor; aqui na 2 Ts Paulo deve exortar àqueles que, confiando na vinda eminente de Cristo não querem mais se ocupar do trabalho cotidiano.
c) O terceiro argumento levantado por aqueles que negam a autenticidade da carta é a questão da parusia (2 Ts 2, 1-12). Em vários textos da 1 Ts a vinda do Senhor parece iminente (1, 10; 2, 19; 3, 13; 4,15.17) e em 2 Ts 2, 1-12 a vinda do Senhor parece estar longe. Parece que aqui, onde Paulo fala dos sinais precursores à vinda do Messias, existe um conflito com a 1 Ts onde Paulo apenas fala da iminência da Parusia e da impossibilidade de se saber quando será. As duas realidades estão intimamente ligadas, o fato de não podermos determinar o dia da Parusia e de percebermos sinais precursores. A 1 Ts não fala que a Parusia do Senhor está longe, mas também não fixa um tempo como podemos ver em 1 Ts 5,1. Em virtude disso, podemos dizer que há uma continuidade no que se refere à doutrina da Parusia na 1 Ts e na 2 Ts.
Em virtude dessas diferenças levantaram-se três grandes linhas na interpretação da autenticidade da carta[4]:
a) Aqueles que afirmam que foram duas cartas escritas num breve intervalo de tempo, porque os tessalonicenses teriam entendido mal a questão da Parusia;
b) Aqueles que afirmam que a carta não é autêntica. Dentro desta linha temos os que acreditam que a carta era originalmente destinada a comunidade de Filipos e foi posteriormente referida à Tessalônica; aqueles que acreditam que a 2 Ts foi redigida de forma paralela à 1 Ts, que também não era autêntica; e aqueles que acreditam que um autor tardio teria escrito a 2 Ts baseando-se na 1 Ts e atribuído o escrito a Paulo (pseudonímia).
c) Aqueles que acreditam que a carta é autêntica, escrito numa circunstância bastante diferente da 1 Ts.
Quanto à datação devemos recorres às três hipóteses acima. Para os que seguem a hipótese “a” a 2 Ts foi escrita poucos meses depois da 1 Ts. Para os que seguem a hipótese “b” a 2 Ts teria sido escrita no final do século I. Para os que seguem a hipótese “c” não podemos determinar a data do escrito.
2. Estrutura
Introdução: 1, 1-12
1ª Parte – a Parusia: 2, 1-17
2ª Parte – Exortações morais: 3, 1-15
Conclusão: 3, 16-18
3. Teologia
Os “exaltados” da comunidade de Tessalônica acreditavam que a Parusia do Senhor estava iminente e, por isso, achavam desnecessário trabalhar (vide a crítica de Paulo aos ociosos em 2 Ts 3, 10-12). Já no capítulo 2 Paulo havia exortado a respeito dos fatos que devem preceder à Parusia do Senhor. Poderíamos, baseados neste dado, dizer que a expectativa escatológica da 2 Ts é diferente daquele descrito na 1 Ts, uma vez que aqui a Parusia parece um evento longínquo, enquanto lá parecia ser já um fato iminente. Devemos levar em conta o que Paulo diz em 1 Ts 5,1, ao afirmar que não sabemos o dia nem a hora da Parusia do Senhor. O que Paulo quer aqui é mostrar que a expectativa da vida do Senhor não pode redundar em fanatismos que levem os cristãos a se desresponsabilizar pelo tempo presente. Cada um, como exorta São Paulo, deve continuar trabalhando para ganhar o pão de cada dia, deve contribuir para o crescimento da sociedade humana, enquanto espera a manifestação do Reino de Cristo.
Ainda hoje, as duas cartas à comunidade de Corintos. Até mais!
Diácono Flávio – PSF
[1] Rinaldo Fabris. Pablo, El apóstol de las gentes. p. 413
[3] Eufemismo que Paulo utiliza na 1 Ts para designar aqueles que morreram.
[4] Maria de Lourdes Corrêa Lima. Apostila sobre as cartas paulinas.mimeo
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